programação
Boca do mundo
Fábio Menino
22/03/2025 até 29/06/2025
A Casa de Cultura do Parque tem o prazer de apresentar, de 22 de março a 29 de junho de 2025, seu I Ciclo Expositivo que reúne obras que desafiam as tradições da pintura, fotografia e produção têxtil.
No Projeto 280×1020, o artista Fábio Menino apresenta “Boca do mundo”, exposição na qual, valendo-se da apropriação – recurso também utilizado por Martins-Costa –, resgata imagens de objetos vinculados ao mundo do trabalho manual. Suas pinturas mobilizam imagens de objetos produzidos em escala industrial, usualmente encontrados em propagandas e catálogos ou pintadas em fachadas de lojas de ferramentas e materiais de construção.
Aproximando-se das proposições da coletiva que ocupa a Galeria, a exposição de Menino busca revelar o potencial plástico desses objetos cotidianos – ora através de representações realistas, ora tangenciando a pintura abstrata –, atentando-se também às suas cargas simbólicas, que suscitam debates sociológicos de classe e de práticas de consumo.
O que há num nome?
“As coisas estão no mundo, só que eu preciso aprender”
Paulinho da Viola, 1968
As coisas não aparecem nas pinturas de Fábio Menino como se estivessem no mundo. Pairam verticalizadas e centralizadas no espaço difuso, por vezes são manipuladas por figuras humanas anônimas e envoltas por um halo de luz própria que enfatiza a planaridade das superfícies pintadas. Podemos vê-las tanto como coisas do mundo, corpos que ocupam volume no espaço, quanto como formas e campos de cor em interações que pouco têm a ver com a natureza do que representam.
A combinação de óleo com cera de abelha e a fatura meticulosa, repleta de pentimentos, conferem às telas uma qualidade rústica e arcaica, contrastante com o que o filósofo Byung-Chul Han chamou de “estética do liso” e que certos objetos apresentariam, tais como os relógios, extintores, garrafas de plástico, velas de resina e, principalmente, o capacete. A tonalidade opaca das pinturas também se obtém por uma profusão de incisões, ou inscrições que o artista produz com ponta seca para criar, em suas palavras, um “ruído de fundo”.
Embora este procedimento participe da operação de resgate das coisas para um estado de suspensão das suas funcionalidades, os “ruídos” constituem um universo variado de signos com traços, os símbolos do coração e do cifrão, palavras que designam os objetos pintados, como as “assinaturas originárias” pensadas pelo místico Paracelso, e o sobrenome do artista. Pela conotação impessoal da palavra “menino”, o nome cria, como diz Fábio, “atrito” com a cultura de arte autoral a que todo trabalho assinado remete.
O dilema da autoria não se restringe ao ruído da assinatura ambígua. Uma vez que quase todos os objetos pintados são manufaturados ou industrializados, neles se afigura um anonimato diferente daquele dos artífices pré-modernos aos quais Fábio Menino parece acenar. Na produção em série, as marcas das relações produtivas se apagam completamente, ao contrário do artesanato e das obras de arte.
Outro aspecto peculiar é o fato de que muitos dos objetos pintados são ferramentas utilizadas pela classe trabalhadora. Somente o operário vê tijolos, o dono da casa vê a parede revestida. Ricos não sobem escadas de madeira, não varrem o chão nem usam serras de marcenaria. Velas votivas também podem ser consideradas como ferramentas dos importantes mecanismos de coesão social que são os rituais religiosos. O capacete, que esconde o rosto, é um poderoso emblema da forma extrema de exploração do trabalho que é a entrega por aplicativo.
A sós, aos pares, aos trios, ou dispersas pelo campo e o espaço, as coisas assumem a dignidade de pessoas, na contramão da mercantilização da força de trabalho, que transforma pessoas em coisas. Figurando como sagradas as coisas do mundo, escavando os signos de suas qualidades invisíveis, Fábio Menino esquadrinha possibilidades de humanização das relações sociais envolvidas no modo de produção das coisas feitas por mãos humanas.
José Bento Ferreira
As mostras do I Ciclo Expositivo 2025 têm direção artística de Claudio Cretti, idealização do Instituto de Cultura Contemporânea (ICCo) e sua realização conta com o apoio do Ministério da Cultura, por meio da Lei de Incentivo à Cultura.
Abertura: 22 de março de 2025, sábado, das 14h às 18h
Visitação: 22 de março a 29 de junho de 2025
Quarta a domingo, das 11h às 18h